Pressão nos Preços Agropecuários: Uma Análise Completa
Por que os preços agropecuários dispararam?
Nos últimos anos, os preços dos produtos agropecuários passaram por forte pressão de alta. Vários eventos inesperados impactaram os mercados na década de 2020. O ano de 2022 marcou um forte pico de alta nesses preços, tanto em nível nacional quanto internacional.
Essa tendência causou preocupação entre produtores, consumidores e especialistas do setor. É essencial entender os fatores que contribuíram para essa escalada.
A Formação de Preços das Commodities Agrícolas
Commodities e o Mercado Internacional
No caso dos mercados das commodities agrícolas com forte presença no mercado mundial, como soja, milho, café e açúcar, o preço em dólar é formado no mercado internacional. Os fundamentos da oferta e demanda mundiais são cruciais para essa formação.
A economia ensina que o preço de um produto homogêneo segue a Lei do Preço Único. Isso significa que, após ajustes logísticos, o preço será o mesmo, quando cotado na mesma moeda em diferentes regiões.
O Conceito de Paridade de Preços Internacionais (PPI)
De acordo com a Paridade de Preços Internacionais (PPI), no caso do Brasil, o preço externo cotado em dólar é internalizado pela taxa de câmbio doméstica. Esse fator tem um papel determinante na formação do preço doméstico, que é cotado em Real, a moeda brasileira.
Segundo estudos de Barros (2023) e Barros (2024), a PPI faz com que os preços domésticos oscilem ancorados nos seus correspondentes internacionais internalizados.
Fatores de Divergência de Preços
Oscilações de Curto Prazo
No curto prazo, pode haver divergências entre o preço doméstico e o internacional por conta de rigidezes operacionais de mercado ou variações inesperadas de oferta e demanda. Contratos a termo e o intervalo de tempo necessário para ajustes são exemplos de fatores que causam essa divergência.
Quebras de Safra e Escassez Internacional
Algumas vezes, a quebra de safra de um produto nacional leva a altas de preços domésticos na proporção em que essa quebra provoca escassez internacional. Isso força uma elevação de preços em dólares, que será então internalizada ao mercado doméstico conforme a taxa interna de câmbio.
Produtos com Comércio Exterior Não Expressivo
Mas e no caso de produtos como o arroz, o feijão e as frutas? Segundo Barros (2024), a PPI influencia os preços domésticos mesmo quando o comércio com o exterior não é expressivo. A simples abertura ao exterior, com a possibilidade de transações, já basta para que a PPI tenha efeito.
Se o preço doméstico estiver abaixo da PPI, há incentivo para exportar; caso contrário, haverá incentivo para importar. Assim, as variações dos preços agropecuários no mercado doméstico são afetadas tanto pelo mercado internacional quanto pela taxa de câmbio.
Avaliação de Preços Agropecuários
Índice de Preços ao Produtor Agropecuário (IPPA)
Uma medida dos preços desses produtos no Brasil é o IPPA (Índice de Preço ao Produtor Agropecuário), calculado pelo Cepea. Esse indicador refere-se aos preços de quatro grupos de produtos: Grãos, Pecuária, Hortifrutícolas e Cana-de-Açúcar/Café.
Indicador Internacional de Alimentos e Bebidas
Para a avaliação dos preços internacionais, utiliza-se o indicador de alimentos e bebidas do Fundo Monetário Internacional (Food & Beverage – FMI). Esse indicador considera uma cesta semelhante de produtos e é um excelente comparativo com o IPPA.
Evolução de Preços no Brasil
Figura 1: Evolução mensal dos índices de preços nominais de produtos agropecuários no mercado brasileiro (IPPA- Cepea) e internacional internalizados (F&B/R$) – Janeiro/2001 a Fevereiro/2024. Fontes: Cepea/Esalq-USP, Ipeadata, FMI. Cálculos da autora.
O Pico dos Preços em 2022
A Figura 1 mostra a evolução dos índices de preços IPPA-Cepea e F&B-FMI-R$. A aderência entre as duas séries é expressiva, indicando a vigência da PPI entre os preços aos produtores agropecuários do Brasil e a média dos preços praticados no mercado internacional internalizado em moeda nacional.
Desvios moderados ocorrem devido a rigidezes nos ajustes dos mercados, contratos futuros e acordos regionais. Esses fatores dificultam a rápida adaptação a mudanças inesperadas.
O Impacto do Câmbio e o “Boom das Commodities”
Observando a evolução dos índices e do câmbio, verifica-se que, de 2001 a 2008, houve uma contínua elevação de F&B/US$, conhecido como “boom das commodities”. Esse nível alto sustentou-se até 2014. No entanto, essa internalização de preços está ligada ao comportamento do câmbio doméstico.
Figura 2: Índices F&B/US$ e Câmbio (R$/US$) – Janeiro/2001 a Fevereiro/2024. Fontes: FMI, Ipeadata. Cálculos da autora.
Os Desdobramentos Durante a Pandemia
No início da pandemia, ocorreu uma forte alta da moeda brasileira em 2020. O F&B/US$ subiu em 2021, com pico em 2022. Esses componentes contribuíram para a alta em IPPA no Brasil. A Figura 2 ilustra bem essa evolução.
O Efeito do Auxílio Emergencial
De meados de 2020 a início de 2023, o IPPA apresentou um overshooting em relação ao F&B/R$, atribuído ao Auxílio Emergencial. Esse auxílio, embora necessário, não foi antecipado pelo mercado, causando um grande aumento na demanda interna.
Períodos de Valorização e Desvalorização da Moeda
Entre 2010 e 2015, a desvalorização do câmbio no Brasil foi substancial. Assim, o F&B/US$ permaneceu elevado, mas relativamente estável. O aumento em F&B/R$ e IPPA deveu-se à desvalorização da moeda brasileira.
Queda Relativa e Estabilidade nos Preços
Desde 2015, F&B/US$ desceu cerca de 20% até meados de 2020, enquanto o câmbio no Brasil oscilou. Ao passar da pandemia, câmbio e F&B/US$ sofreram decréscimos e estabilizaram-se em patamares mais baixos, restaurando a PPI em setembro de 2023.
Conclusão: A Sequência de Eventos no Século XXI
Em resumo, segundo a PPI, a sequência de eventos neste século mostrou que, durante o “boom das commodities”, os preços domésticos avançaram menos que os internacionais. A valorização do câmbio causou diferença nessa época. Mas, a partir de 2011, a desvalorização do câmbio elevou o preço internacional internalizado.
Entre 2020 e 2022, a pandemia trouxe desarranjos nas cadeias produtivas e um aumento imprevisto na demanda interna. Isso fez com que o IPPA superasse F&B/R$. No entanto, a normalização da oferta mundial e a alta da safra brasileira em 2022/2023 levaram os preços domésticos a tenderem às condições do mercado internacional, sugerindo um restabelecimento da PPI.
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Última atualização em 8 de junho de 2024