Lei para biológicos pode ser votada em setembro (e ainda tem divergência)
Com crescimento anual de 30% no Brasil, o setor de biológicos atrai investimentos, mas carece de mais regulamentação.
Em reportagem recente, foi mostrado o verdadeiro “nó” que precisaria ser desatado em Brasília para aprovar uma lei específica para biológicos.
A falta de consenso se justifica pelos interesses muitas vezes divergentes entre as grandes multinacionais, que fazem investimentos bilionários em produtos industriais, fábricas menores do segmento e até as biofábricas nas fazendas, que viabilizam a produção dos bioinsumos no chamado “on farm”.
A boa notícia é que esta semana houve um amadurecimento significativo nas discussões entre os representantes de produtores rurais e da indústria para que, finalmente, possa ser criado um marco regulatório dos bioinsumos.
A base do acordo é o documento entregue ao presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Pedro Lupion, por 52 entidades representativas do setor produtivo, como CNA, Aprosoja Brasil, Sindiveg, Abiove e SRB, englobando indústria e produtores.
Trata-se de uma proposta de substitutivo para o texto do Projeto de Lei 658, um dos dois que abordam o tema e que tramitam no Congresso Nacional.
Segundo o documento, o objetivo é “a construção de um ambiente regulatório onde as partes interessadas possam trabalhar e conviver de maneira harmônica e com sentimento de participação em um mercado justo.”
As entidades observam que a construção da proposta não “desprezou” os PLs em tramitação na Câmara e no Senado Federal.
Atualmente, dois projetos de lei estão no Congresso Nacional (PL nº 658, de 2021 e PL 3.668, de 2021) com o objetivo de regular a produção e o uso de defensivos biológicos. No entanto, ambos os textos têm pontos de divergência entre as partes.
Desafios na Regulamentação dos Bioinsumos
Em entrevista recente, Reginaldo Minaré, diretor-executivo da Associação Brasileira de Bioinsumos (ABBINS), destacou que o PL 658, não apresenta uma estrutura clara de registro de produtos industriais, por tratar da produção para uso próprio, o que pode gerar insegurança jurídica.
Já o PL 3668 é criticado por excluir a pecuária e ter um texto limitado que pode induzir a burocracias desnecessárias. Minaré explica que, diante dessas dificuldades, um grupo representativo do setor trabalhou na construção de um texto substitutivo que inclui elementos de ambos os projetos, buscando criar uma legislação mais completa e funcional.
A Necessidade de Inclusão de Órgãos de Avaliação
Um ponto sensível de divergência no novo texto é a definição do processo de registro dos bioinsumos. A proposta sugere um registro simplificado para produtos similares e consulta a outros órgãos, como Anvisa e Ibama, apenas para novos produtos. Essa abordagem, no entanto, não satisfaz a CropLife Brasil, que representa grandes multinacionais do setor.
Amália Borsari, diretora de Bioinsumos da CropLife Brasil, defende a inclusão obrigatória de Anvisa e Ibama no processo de registro. Ela argumenta que certos bioinsumos, como algumas bactérias, têm potencial para causar doenças em humanos ou desequilíbrios ambientais e, por isso, necessitam de uma avaliação rigorosa.
Protocolos Internacionais vs. Realidade Nacional
Borsari menciona que países como Estados Unidos e nações europeias têm protocolos rigorosos para avaliação de biológicos, incluindo análises toxicológicas e ecotoxicológicas. Estes padrões internacionais buscam garantir que os produtos não causem danos ao meio ambiente ou à saúde humana.
Ela ressalta que o Ministério da Agricultura do Brasil ainda não tem competência plena para realizar essas avaliações, o que pode gerar um desalinhamento de segurança e afetar exportações brasileiras. A preocupação é que, sem essas avaliações mais rigorosas, a competitividade internacional dos produtos biológicos brasileiros pode ser comprometida.
Urgência no Campo: A Pressão dos Produtores
Nas fazendas, a urgência pela aprovação do marco regulatório dos bioinsumos é perceptível, especialmente após a regulamentação dos agrotóxicos pela Lei 14.765, sancionada em dezembro do ano passado. Com a obrigatoriedade de registro de todos os defensivos, inclusive os biológicos, milhares de produtores que fazem seus bioinsumos nas fazendas encontram-se agora em uma situação de ilegalidade.
O prazo para adaptarem-se às novas regras termina em dezembro deste ano, aumentando a pressão para que uma solução legislativa seja encontrada rapidamente. A previsão é que um texto substitutivo ao PL 658 seja discutido e votado entre setembro e outubro, necessitando de novos encontros para alinhar as expectativas de todas as partes envolvidas.
O Papel das Entidades Representativas
Entidades como a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e a Associação Brasileira de Bioinsumos têm desempenhado papéis cruciais. Elas buscam construir um ambiente regulatório mais harmônico e justo, baseando seus esforços em propostas que somam os interesses de diferentes segmentos do setor produtivo.
A apresentação de um texto substitutivo ao PL 658 é resultado direto dessas negociações. Esse texto busca ampliar o escopo de abrangência e criar uma legislação mais funcional, equilibrando a necessidade de segurança com a competitividade no mercado global.
Preocupações e Demandas da Indústria
A indústria tem demonstrado preocupações específicas, sobretudo em relação ao processo de rastreabilidade dos produtos utilizados. A rastreabilidade foi um dos pontos atendidos no novo texto, mas ainda há preocupações quanto ao registro dos bioinsumos. Se essas preocupações não forem contempladas, existe um risco de criar desalinhamentos que podem comprometer tanto a segurança dos produtos quanto sua competitividade.
A necessidade de um marco regulatório robusto é vista como essencial pela indústria para garantir que os bioinsumos sejam seguros para a saúde humana e ambiental e que estejam alinhados com os protocolos internacionais.
Aprovação da Lei: Expectativas e Consequências
Com a votação prevista para setembro, a expectativa é alta tanto entre produtores quanto na indústria. A aprovação de uma lei específica pode desatar o “nó” que tem dificultado o avanço do setor de bioinsumos no Brasil. No entanto, as divergências ainda presentes precisam ser resolvidas para que todos os interesses sejam atendidos.
Propostas de substitutivos, negociações intensas e a pressão da proximidade do prazo legal de adaptação colocam o Congresso Nacional em uma posição crítica. A solução deve garantir não apenas a segurança dos produtos, mas também sua eficácia e competitividade em um mercado global cada vez mais exigente.
Conclusão
O setor de biológicos no Brasil está em um momento decisivo. O crescimento de 30% ao ano mostra o potencial, mas a falta de uma regulamentação clara cria inseguranças. A urgência por uma legislação que atenda aos diversos interesses do setor é palpável. Se a lei for aprovada, será um passo significativo para consolidar o Brasil como um líder mundial no uso de bioinsumos.
A harmonização dos interesses de produtores, indústria e órgãos reguladores é fundamental. Acreditamos que, com diálogo e cooperação, será possível encontrar um caminho que beneficie todos os envolvidos, promovendo um ambiente regulatório justo e seguro para todos os biológicos no Brasil.
Última atualização em 4 de setembro de 2024