Adiar? Na abertura da cúpula agro do G20, a atenção foi para a regra antidesmatamento europeia








Vai adiar? Na abertura da cúpula agro do G20, a atenção ficou para regra antidesmatamento europeia

Vai adiar? Na abertura da cúpula agro do G20, a atenção ficou para regra antidesmatamento europeia

Chapada dos Guimarães (MT) – O primeiro dia de reuniões ministeriais do Grupo de Trabalho da Agricultura do G20, nesta quinta-feira, 12, em Mato Grosso, teve como perspectiva a possibilidade de suspensão da lei antidesmatamento da União Europeia, aprovada em 2023 com previsão de entrar em vigor em 1º de janeiro de 2025.

Em uma carta assinada pelos ministros da Agricultura, Carlos Fávaro, e das Relações Exteriores, Mauro Vieira, o Brasil definiu a legislação europeia como um “instrumento unilateral e punitivo” e pediu a suspensão da chamada EUDR (European Union Deforestation Regulation).

A regra proíbe a compra de produtos como café, soja, carne, madeira e cacau que sejam oriundos de áreas que tenham sido desmatadas depois de 2020 (e não diferencia desmatamento legal e ilegal).

O documento foi entregue durante o encontro do G20, em Mato Grosso. Fávaro, que participa da cúpula, disse esperar uma resposta do bloco europeu até o dia 1º de outubro.

Quanto à prorrogação do prazo, afirmou que o governo brasileiro “vai buscar outros mecanismos via OMC (Organização Mundial do Comércio).”

“O Brasil teve uma posição muito firme. Nós sabemos das nossas responsabilidades com o meio ambiente, com a produção sustentável, (os europeus) não precisam apontar o dedo e mostrar as diretrizes. O caminho para a mudança é o diálogo e não a imposição, sempre respeitando a soberania dos países”, disse o ministro da Agricultura.

Um dos trechos da carta brasileira destaca: “O Brasil é um dos principais fornecedores para a UE da maioria dos produtos objetos da legislação, que correspondem a mais de 30% de nossas exportações para o bloco comunitário”.

Além da “não implementação”, o documento também pede que a UE “reavalie urgentemente a sua abordagem sobre o tema”.

De acordo com a carta, “A EUDR foi desenhada sem conhecimento de como funciona o processo produtivo e exportador dos diferentes produtos e qual é a realidade em cada país”.

O documento ressalta o fato de os europeus não terem considerado as leis vigentes nos países – como o Código Florestal no Brasil – que visam combater o desmatamento.

Por fim, o texto menciona: “Consideramos a EUDR um instrumento unilateral e punitivo que ignora as leis nacionais sobre combate ao desmatamento; tem aspectos extraterritoriais que contrariam o princípio da soberania; estabelece tratamento discriminatório entre países ao afetar apenas países com recursos florestais; aumenta o custo do processo produtivo e exportador, sobretudo no caso de pequenos produtores; viola princípios e regras do sistema multilateral de comércio e compromissos acordados no âmbito dos acordos ambientais multilaterais”.

Alemanha como aliada

Nesta quinta-feira, o movimento brasileiro recebeu um apoio de peso dentro da própria UE. O chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, pediu à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, para suspender o Regulamento Anti Desflorestamento da União Europeia.

“Sendo claro: a legislação precisa ser praticável”, disse Scholz, ao participar de um congresso da associação de jornais, em Berlim, com a autoridade de quem comanda o maior PIB do bloco.

Desde o início do ano, a Alemanha vem aumentando, por exemplo, as importações de café brasileiro. Segundo o Cecafé, de janeiro a junho as compras do país subiram 70%, assim como dos demais europeus integrantes do bloco.

Seria um sinal de grande preocupação entre os importadores de café sobre como devem ser os procedimentos a partir de janeiro. Empresários do setor, inclusive Andrea Illy, da tradicional illycaffè, têm ressaltado que falta clareza para que a lei seja implementada.

A mobilização das nações em torno do adiamento da entrada em vigor da EUDR vem crescendo, com outros países, incluindo africanos e asiáticos, também manifestando preocupação.

Antes do Brasil, outro grande exportador de produtos agrícolas, havia usado o mesmo expediente de endereçar uma carta às autoridades europeias. Em maio, o governo dos Estados Unidos enviou documento semelhante, assinado pelos secretários de Agricultura, Thomas Vilsack, e de Comércio, Gina Raimondo, pedindo que fosse adiada a implementação da lei.

O tema, é claro, circula na reunião do Grupo de Trabalho da Agricultura do G20, que busca justamente o diálogo entre as principais economias do mundo.

O próprio Fávaro fez referência ao tema em seu discurso na cerimônia de abertura do encontro de ministros da área.

O mesmo aconteceu nas falas de dois representantes do B20, o braço de iniciativa privada do G20. Gilberto Tomazoni, o CEO global da JBS, e Marcos Molina, controlador da Marfrig, também fizeram menções às relações comerciais do Brasil com outros países – ainda que de forma mais genérica e menos explícita.

“Propomos a concordância em torno de um framework para o comércio de alimentos produzidos sobre bases mais sustentáveis, multilateral, alinhado com as regras da OMC e embasado em evidências científicas, assim como medidas práticas de compliance para o aumento da transparência e credibilidade do comércio de alimentos”, disse Tomazoni, que lidera uma força-tarefa do setor privado em relação ao tema.

“Nosso plano visa acelerar soluções para produzir mais, preservando nossa biodiversidade, capturando carbono da atmosfera, aumentando a resiliência dos sistemas de produção de alimentos, energia e fibra para futuras gerações.”

Marcos Molina, da Marfrig, fez coro ao receituário de Tomazoni. “(É importante) garantirmos o comércio de alimentos sem barreiras de forma a promover o crescimento da economia global para garantir a segurança alimentar, além de disseminar práticas ambientalmente responsáveis. Nesse contexto, o momento que vivemos é importante e oportuno para favorecer os sistemas multilaterais de parcerias e cooperação internacional”.

O repórter viajou a convite da JBS.

Impacto da legislação europeia no agronegócio brasileiro

A preocupação com a entrada em vigor da regra antidesmatamento europeia é evidente. O agronegócio brasileiro, um dos principais motores econômicos do país, pode ser significativamente afetado. A proibição de compra de produtos provenientes de áreas desmatadas após 2020 coloca em risco grandes segmentos da exportação brasileira, incluindo a soja, a carne e o café.

Isso levanta uma pergunta crucial: o Brasil está sendo tratado de maneira justa? De acordo com a carta do governo brasileiro, a legislação europeia ignora as complexidades do processo produtivo e as leis nacionais já existentes para combater o desmatamento, como o Código Florestal Brasileiro. Portanto, é essencial que ambos os lados estejam dispostos a dialogar e encontrar uma solução equilibrada.

Críticas e desafios do EUDR

O EUDR tem sido criticado por ser um instrumento unilateral que não leva em consideração as especificidades dos países produtores. Para muitos, essa abordagem é punitiva e desconectada da realidade vivida por pequenos e grandes produtores. As restrições aumentarão os custos de produção e exportação, especialmente para pequenos produtores que já enfrentam dificuldades financeiras.

Além disso, há um aspecto extraterritorial na regulamentação que levanta preocupações sobre a soberania dos países afetados. Como pode um bloco de países impor regulamentos que afetam diretamente as economias de nações independentes? Esse é um dos principais questionamentos levantados pelo Brasil e por outros países afetados.

Importância do diálogo multilateral

Para muitos, a solução para esse impasse está no diálogo multilateral. O G20, sendo um fórum de diálogo entre as principais economias do mundo, oferece a plataforma ideal para discutir essas questões de forma aberta e construtiva. Os representantes do B20, braço do setor privado do G20, também enfatizaram a necessidade de uma abordagem multilateral para o comércio de alimentos sustentáveis.

Propostas foram feitas para desenvolver um framework para o comércio de alimentos baseado em regras da OMC e evidências científicas, a fim de aumentar a transparência e credibilidade do comércio global. Essas medidas são vitais para garantir que o comércio internacional continue a florescer, respeitando as normas ambientais e promovendo práticas sustentáveis.

O papel da diplomacia e das estratégias políticas

Fundamental para a negociação e possível suspensão da EUDR é a atuação diplomática e as estratégias políticas adotadas pelo Brasil e seus aliados. A carta brasileira, que solicita a suspensão e reavaliação da regulamentação, é um passo importante nessa direção. Além disso, o apoio de países como a Alemanha demonstra que existem aliados dentro da própria UE que entendem as preocupações brasileiras.

Seguir “outras vias” pela OMC também é uma estratégia que pode ser usada caso o diálogo não produza os resultados desejados. A questão é complexa e multifacetada, mas a pressão de vários países pode eventualmente levar a uma revisão ou adiamento da legislação.

Conclusão: O que esperar?

À medida que nos aproximamos da data de implementação da EUDR, a incerteza ainda paira no ar. No entanto, é claro que o Brasil e outros países afetados não estão dispostos a aceitar passivamente essa legislação. A cúpula agro do G20 em Mato Grosso destacou a importância de encontrar um equilíbrio entre a preservação ambiental e o crescimento econômico sustentável.

Será que o bloco europeu cederá à pressão e adiará a implementação da lei? Ou será que veremos uma reavaliação significativa que leve em conta as preocupações dos países produtores? Somente o tempo dirá. Enquanto isso, os olhos do mundo estão voltados para as negociações em curso, esperando por uma solução que beneficie todos os envolvidos.


Última atualização em 14 de setembro de 2024

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