Justiça do DF Suspende Outorgas para Captação de Água da UTE Brasília
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) proferiu uma decisão impactante ao suspender as outorgas que permitiam à Usina Termelétrica (UTE) Brasília captar água do Rio Melchior. A medida judicial, resultado de uma ação civil pública movida pelo Instituto Arayara, levanta sérias questões sobre a legalidade e os impactos ambientais da operação da usina. A decisão destaca a importância de uma análise rigorosa dos estudos de impacto ambiental e da necessidade de dados atualizados para garantir a proteção dos recursos hídricos.
A ação do Instituto Arayara argumentou que a Adasa (Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do DF) emitiu as outorgas de forma irregular, permitindo a captação de 110 mil litros de água por hora de um rio classificado como nível quatro, o que impede seu uso para praticamente qualquer atividade humana. Essa decisão do TJDF representa um marco na luta pela preservação ambiental e coloca em xeque a sustentabilidade de projetos que negligenciam a qualidade e a disponibilidade dos recursos naturais.
Entenda a Decisão Judicial
A decisão do TJDF fundamenta-se na constatação de irregularidades nos atos administrativos que autorizaram a UTE Brasília a utilizar os recursos hídricos do Rio Melchior. A vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do DF, ao analisar a ação civil pública, identificou falhas nos processos de licenciamento e outorga, considerando que os estudos apresentados não refletiam a realidade da bacia hidrográfica e seus impactos potenciais. Essa análise minuciosa do judiciário demonstra a importância de um controle rigoroso sobre as atividades que possam comprometer o meio ambiente.
A suspensão das outorgas representa uma vitória para os ambientalistas e a sociedade civil, que há tempos vêm alertando para os riscos da exploração desenfreada dos recursos naturais. A decisão judicial serve como um alerta para empresas e órgãos públicos, reforçando a necessidade de transparência e responsabilidade na gestão dos recursos hídricos e na avaliação dos impactos ambientais de grandes empreendimentos.
O Debate Sobre a Qualidade da Água do Rio Melchior
O cerne da questão reside na classificação do Rio Melchior como um corpo d’água de nível quatro, o que, segundo os ambientalistas, inviabiliza qualquer tipo de uso humano. Essa classificação, que indica um alto grau de poluição e degradação, coloca em dúvida a capacidade do rio de suportar a captação de água para fins industriais, como o resfriamento da UTE Brasília. A utilização de água de um rio com essa classificação pode trazer sérios riscos para o meio ambiente e para a saúde pública.
Além da classificação do rio, o Instituto Arayara questiona a qualidade da água que retorna ao rio após o uso na UTE Brasília. Segundo estudos da organização, 94% da água captada retorna ao rio com temperatura elevada, o que agrava ainda mais a situação ecológica do ecossistema. Esse aumento da temperatura da água pode causar a morte de peixes e outros organismos aquáticos, além de comprometer a qualidade da água para outros usos.
Dados Defasados e o Plano de Gerenciamento da Bacia do Parnaíba
Um dos pontos críticos apontados na ação civil pública é a utilização de dados hidrológicos defasados para embasar o projeto da UTE Brasília. Os dados utilizados datam de 13 anos atrás, o que significa que não refletem as mudanças ocorridas na bacia hidrográfica ao longo desse período. A utilização de dados desatualizados pode levar a uma avaliação equivocada dos impactos ambientais do empreendimento e a uma gestão inadequada dos recursos hídricos.
Outro aspecto relevante é a alegação de que o planejamento da UTE Brasília ignora as atualizações feitas em 2020 no Plano de Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos da Bacia do Parnaíba, na qual o Rio Melchior se insere. Esse plano estabelece diretrizes e metas para a gestão dos recursos hídricos da bacia, e sua não observância pode comprometer a sustentabilidade do empreendimento e a proteção do meio ambiente.
A Defesa da Termo Norte e a Tecnologia de Resfriamento a Ar
A Termo Norte, responsável pela UTE Brasília, se defende argumentando que a outorga para uso da água foi obtida com base em critérios técnicos e ambientais rigorosos, e que a Adasa atestou a viabilidade do projeto. A empresa afirma que a captação no Rio Melchior é mínima e que 95% da água tratada retorna ao rio com qualidade superior à da água captada. Além disso, a Termo Norte alega que a usina utiliza tecnologia de resfriamento a ar, o que reduz significativamente o consumo hídrico.
Apesar dos argumentos da Termo Norte, a decisão do TJDF demonstra que as alegações da empresa não foram suficientes para afastar as dúvidas e questionamentos levantados pelo Instituto Arayara e pelo Ministério Público. A suspensão das outorgas coloca em xeque a sustentabilidade do projeto e exige uma reavaliação dos seus impactos ambientais.
Impactos Socioambientais Potenciais
Além dos impactos ambientais diretos, como a degradação da qualidade da água e a alteração do ecossistema, a UTE Brasília também pode gerar impactos socioambientais significativos. O Instituto Arayara aponta a ameaça à existência de uma escola pública que atende 348 crianças na periferia do Distrito Federal, que poderia ser afetada pela poluição e pela degradação ambiental decorrentes da operação da usina. A saúde e o bem-estar da população local devem ser levados em consideração na avaliação dos impactos do empreendimento.
Outro impacto potencial é a poluição do ar decorrente da queima de gás natural para a geração de energia. Segundo estudos da Arayara, a queima de gás natural liberaria uma massa de poluentes tóxicos que atingiria o Plano Piloto e outras regiões administrativas de Brasília, piorando a qualidade do ar e aumentando a incidência de chuva ácida. A combinação de poluentes pesados, ar seco e padrões de vento locais pode transformar Brasília em uma câmara de poluição atmosférica, com graves consequências para a saúde pública.
Futuras Perspectivas
A decisão do TJDF abre um importante precedente para a proteção dos recursos hídricos e do meio ambiente no Distrito Federal e em todo o país. A suspensão das outorgas da UTE Brasília demonstra que o judiciário está atento aos riscos da exploração desenfreada dos recursos naturais e que está disposto a intervir para garantir a proteção do meio ambiente e da saúde pública. A decisão também reforça a importância do papel da sociedade civil e das organizações não governamentais na fiscalização e no controle das atividades que possam comprometer o meio ambiente.
O futuro da UTE Brasília é incerto. A Termo Norte informou que vai avaliar as medidas cabíveis para reverter a decisão judicial, mas o processo de licenciamento e outorga da usina deverá ser reavaliado à luz dos novos dados e das novas diretrizes estabelecidas pelo Plano de Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos da Bacia do Parnaíba. A decisão final sobre o futuro da UTE Brasília terá um impacto significativo no meio ambiente e na sociedade do Distrito Federal.
Última atualização em 17 de junho de 2025