Energia elétrica já pressiona a inflação e vai ficar mais cara no mercado livre em 2026

Consumo de energia elétrica cresce 1,7% em junho no Brasil, aponta SIN.

A energia elétrica voltou a ser o item que mais pesou no bolso em setembro. A conta de luz subiu 10,31% no mês e, sozinha, respondeu por 85% da inflação medida pelo IPCA, segundo o IBGE. O movimento refletiu o fim do bônus de Itaipu que reduziu as faturas em agosto, a ativação da bandeira vermelha patamar 2 ao longo de setembro e reajustes anuais de distribuidoras. Para o consumidor empresarial que compra no mercado livre, o sinal também é de pressão adiante.

Projeções de associações do setor indicam que os custos no ambiente livre podem subir a partir de 2026, com impacto médio estimado entre 5% e 12% nas tarifas contratadas. Na conta estão novas regras sancionadas pelo governo, mudanças na forma de ratear encargos e a evolução do próprio mercado, que tende a ampliar a competição por lastro e energia. Em paralelo, decisões regulatórias recentes e debates no Congresso redesenham responsabilidades e obrigações de agentes.

 

O que explica o salto de setembro e por que 2026 preocupa

A alta de 10,31% na energia residencial em setembro concentrou a maior parte da inflação do mês. Três fatores puxaram o índice. Primeiro, o benefício temporário nas tarifas por conta de Itaipu deixou de valer, o que gerou efeito estatístico de devolução. Segundo, a vigência da bandeira vermelha patamar 2, que adiciona cobrança extra por cada 100 kWh consumidos, elevou o custo marginal para atendimento do sistema. Terceiro, reajustes anuais de algumas distribuidoras reforçaram a pressão pontual no IPCA. O resultado foi um alívio curto em agosto seguido de escalada rápida em setembro.

Para 2026, o foco passa a ser o mercado livre. Cálculos da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace) apontam acréscimo de até R$ 65 por MWh nos contratos do ambiente livre com a entrada de novas regras. A estimativa considera componentes como subsídios tarifários, redistribuição de custos de geração específica e efeitos do crescimento da geração distribuída. Em termos percentuais, o impacto médio projetado varia de 5% a 12% nos preços de fornecimento, dependendo do perfil de consumo e da estratégia contratual de cada empresa.

 

Luz do Povo e CDE: entenda o repasse para quem compra no livre

A lei que criou o programa Luz do Povo ampliou a tarifa social para garantir gratuidade no consumo de até 80 kWh por mês às famílias elegíveis. O custeio vem da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), encargo pago pelos demais consumidores. No mercado livre, a Anace estima que o custo da gratuidade deve representar entre R$ 15 e R$ 20 por MWh, embutidos no preço final de energia para indústrias e empresas conectadas em média e alta tensão. Na prática, é um repasse das políticas públicas para a base pagadora do sistema, com impacto direto na formação de preço dos contratos livres.

Além do benefício, outras medidas entram na conta. O novo rateio da geração das usinas de Angra I e II é apontado como um acréscimo de R$ 7 a R$ 12 por MWh. A isenção de CDE para o grupo de menor renda adiciona algo entre R$ 0,50 e R$ 1 por MWh para os demais. Há, ainda, vetores de mercado: o avanço da geração distribuída, a prorrogação de contratos do Proinfa e o próprio crescimento do ambiente livre tendem a pressionar encargos em faixas de R$ 4 a R$ 8 por MWh cada, conforme as simulações divulgadas. Somados, formam um cenário de custos ascendentes que exigirá mais planejamento do consumidor livre.

 

Bandeiras, reservatórios e térmicas: como o risco operacional entra no preço

O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) sinalizou que, em cenário desafiador, pode haver necessidade de despacho térmico adicional, aumento da produção das hidrelétricas do rio São Francisco e uso mais intenso do reservatório de Itaipu. Sempre que as térmicas entram, o custo marginal sobe porque as usinas a gás, óleo ou carvão, quando despachadas, têm custo variável maior do que o das hidrelétricas. A consequência natural é um efeito de alta em encargos e, em alguns casos, no preço de curto prazo, que se propaga para a precificação de contratos, principalmente em janelas de contratação mais próximas ao fornecimento.

Para quem compra no livre, a exposição ao PLD deve ser minimizada por meio de contratos com cobertura adequada. Empresas intensivas em energia tendem a adotar estratégias combinadas: contratos de energia “convencional” e “incentivada” em prazos diferentes, com gatilhos de flexibilidade, além de mecanismos de ajuste para sazonalidade. Monitorar o balanço energia-carga e testar cenários de hidrologia e despacho térmico ajudam a dimensionar a parcela descoberta que, se mal calibrada, pode encarecer a fatura justamente em períodos de maior risco sistêmico.

 

“MP dos Vetos” e abertura do mercado: prazos e o que está em jogo

Parte das propostas do governo para reformar o setor, incluindo a expansão do acesso ao mercado livre e ajustes na CDE, foi incorporada à chamada “MP dos Vetos” (1304). A medida provisória tem prazo de vigência até novembro de 2025. Se caducar, pontos da reforma podem perder a janela de implementação, o que reabriria discussões no Legislativo e criaria incerteza para o cronograma de abertura do mercado. Para as empresas, regras claras são essenciais porque orientam decisões de compra, investimento e gestão de risco com antecedência.

Entre os itens acompanhados por agentes e consumidores estão a velocidade de ampliação do acesso ao ambiente livre, o desenho dos encargos setoriais e a distribuição de custos entre os diferentes perfis de consumo. A incerteza regulatória encarece o capital e reduz a disposição de vendedores de energia em oferecer prazos mais longos ou preços mais competitivos. Por isso, a definição do texto final e do calendário é vista como peça-chave para tirar volatilidade do horizonte de 2026.

 

Fiscalização e concessões: o impacto de decisões recentes da Aneel e da Justiça

A Aneel aplicou multa de R$ 15 milhões à Equatorial Goiás Distribuidora por compartilhamento indevido de dados de consumidores com a comercializadora do mesmo grupo. Segundo a agência, houve vantagem competitiva indevida no mercado livre. O caso acende alerta sobre governança em operações com empresas relacionadas e reforça a necessidade de barreiras informacionais robustas para evitar assimetria de dados. No médio prazo, decisões desse tipo buscam preservar concorrência e transparência para compradores que dependem de cotações isentas.

No Rio, o comando da Light afirmou que, com a renovação da concessão, a companhia pretende executar o maior ciclo de investimentos de sua história. Em São Paulo, a Justiça Federal determinou que a Aneel suspendesse o processo de renovação da concessão da Enel Distribuição São Paulo até a conclusão da análise sobre os apagões de novembro de 2023 e outubro de 2024. Esses movimentos afetam planos de investimento e qualidade de serviço, variáveis que, mais à frente, também entram no cálculo das tarifas por meio de revisões e metas regulatórias.

Ferramentas e práticas para reduzir surpresas na conta

– Medição e dados: instale sistemas de medição em tempo quase real e dashboards de consumo. A granularidade horária permite identificar picos e ajustar processos. Quanto melhor o dado, mais preciso o perfil de carga, e mais barata tende a ser a cobertura contratual.

– Resposta da demanda: em operações com flexibilidade, programe paradas e deslocamentos de produção para horários de menor preço, quando aplicável. No curto prazo, a simples reorganização de turnos pode reduzir a fatura sem investimento adicional. Para casos com automação, valem algoritmos de otimização que cruzam PLD, contratos e restrições operacionais.

  • Auditoria de faturas: confira encargos, perdas e tributos. Erros de faturamento acontecem e podem ser corrigidos.
  • Benchmark de preços: compare propostas de diferentes comercializadoras em prazos comparáveis e com as mesmas premissas de encargos.
  • Cláusulas de saída: verifique multas e condições de rescisão para evitar aprisionamento em contratos desvantajosos.

Perguntas e respostas rápidas sobre a alta da energia e 2026

O que puxou a inflação de setembro?

Energia elétrica residencial, com alta de 10,31%. O item respondeu por 85% do IPCA do mês, segundo o IBGE, por causa do fim do bônus de Itaipu, da bandeira vermelha patamar 2 e de reajustes de distribuidoras.

Quem compra no mercado livre deve esperar o quê para 2026?

Projeções indicam acréscimo de até R$ 65/MWh com novos encargos e ajustes regulatórios, o que representa impacto médio estimado entre 5% e 12% nos preços de energia, variando conforme o perfil de consumo e a estratégia contratada.

Qual o efeito do Luz do Povo?

Gratuidade até 80 kWh por mês para um grupo elegível, custeada pela CDE. No livre, estimativa de R$ 15 a R$ 20/MWh do total projetado.

E Angra I e II?

Novo rateio pode acrescentar R$ 7 a R$ 12/MWh.

Outros vetores?

Isenção da CDE para baixa renda (R$ 0,50 a R$ 1/MWh), avanço da geração distribuída (R$ 4 a R$ 8/MWh) e Proinfa (R$ 4 a R$ 8/MWh), segundo as simulações citadas.

 

Como o CMSE pode influenciar sua conta de luz

Se o CMSE indicar necessidade de térmicas, o custo marginal de operação sobe. Isso se reflete nos encargos e, dependendo da exposição de cada consumidor, no preço pago ao longo do contrato. Em cenários de hidrologia adversa, o uso de reservatórios como o de Itaipu ajuda a atender a carga, mas reduz a folga para momentos posteriores, mantendo os preços sensíveis a riscos climáticos e operacionais.

Empresas com contratos que vencem em 2025 e 2026 tendem a avaliar compras escalonadas. A diversificação de prazos, fornecedores e produtos (energia “convencional” e “incentivada”) reduz o risco de concentrar toda a exposição em um único momento de mercado. O objetivo é preservar previsibilidade de caixa, principalmente para negócios com margens apertadas e forte intensidade elétrica.

Casos em discussão no Judiciário e efeitos indiretos

Decisões sobre concessões, como as que envolvem Light e Enel São Paulo, podem alterar cronogramas de investimento e planos de melhoria de rede. Na outra ponta, multas como a aplicada à Equatorial Goiás visam coibir distorções competitivas. Em ambos os casos, a régua regulatória influencia a qualidade de serviço e a eficiência na distribuição, elementos que entram na tarifa por meio de revisões periódicas e metas de perdas e continuidade.

Para o consumidor do mercado livre, a transmissão dessas decisões para o preço é indireta e lenta, mas real. A percepção de risco setorial afeta o custo de capital das empresas e, por tabela, os preços praticados por geradoras e comercializadoras. Quem se antecipa na negociação costuma capturar condições melhores do que quem decide quando o assunto já está nos holofotes.

Dicas práticas para reduzir o gasto com energia sem investimento alto

– Reprogramação de processos: ajuste janelas de maior consumo para horários de menor preço, quando sua operação permitir. Pequenas alterações em turnos e setups reduzem picos e evitam penalidades por ultrapassagem em contratos com demanda contratada.

– Manutenção de motores e compressores: verifique alinhamento, lubrificação e limpeza de filtros. Eficiências típicas de 3% a 7% surgem apenas com manutenção de rotina. Em instalações com muitas horas de uso, esse ganho aparece na fatura do mês seguinte.

  • Iluminação: trocar lâmpadas antigas por modelos eficientes reduz consumo e calor nos ambientes, aliviando também a climatização.
  • Ar comprimido: conserte vazamentos e ajuste pressões. O sistema é uma das maiores fontes de desperdício em fábricas.
  • Climatização: revise setpoints e cronogramas. Equipamentos trabalhando fora do horário ou com temperatura abaixo do necessário encarecem a conta.

Checklist de contratação no ACL para 2026

– Levantamento de carga: consolide histórico de 24 a 36 meses e projete 2026 por área produtiva. Identifique fatores sazonais, paradas programadas e expansão de turnos. A qualidade da projeção define a precisão do seu hedge de energia.

– RFI e RFP com padronização: envie solicitações a múltiplas comercializadoras com planilhas idênticas de premissas e encargos. Peça cenários com e sem flexibilidade e simule penalidades por desvios de 5%, 10% e 20%.

  • Garantias: verifique exigências de crédito, seguros e limites de exposição. Condições mais leves podem esconder preços maiores.
  • Liquidação: entenda fluxos de medição, conciliação e liquidação. Erros nesse processo criam custos ocultos.
  • Governança: defina papéis internos (compras, operações, finanças) para aprovar contratos com rapidez quando surgir janela favorável.

Como ler sua fatura e identificar oportunidades

– Separação de blocos: entenda o que é energia, o que são encargos (CDE, ESS, Proinfa) e o que são tributos (ICMS, PIS/Cofins). Separe os percentuais e verifique a evolução mês a mês para detectar desvios fora do padrão.

– Perdas e ajustes: acompanhe as diferenças entre medição e faturamento. Em algumas instalações, ajustes de medidores e correções de fator de potência geram economias imediatas. Acompanhe indicadores de demanda contratada e verifique se há ultrapassagens recorrentes.

Vozes do setor e opinião técnica

Carlos Faria, diretor-presidente da Anace, reconhece a importância dos benefícios sociais, mas chama atenção para o impacto nas empresas que financiam o sistema. O ponto central é calibrar a distribuição de custos para não desequilibrar a competitividade de setores eletrointensivos, que disputam mercados internacionais com pares expostos a estruturas tarifárias diferentes. A previsibilidade, segundo ele, é o principal fator para conciliar política social e estabilidade de preços para a indústria.

Em outra frente, executivos citam que a exigência de energia “nova” em zonas especiais de processamento pode transformar a matriz contratual de empreendimentos industriais. A regra tende a incentivar contratos dedicados e arranjos de autoprodução com foco em custos nivelados de longo prazo. Para os investidores, isso reduz a dependência de janelas de curto prazo e diminui o risco de volatilidade sobre projetos com cronogramas longos.

O que observar até o fim de 2025

– Trâmite da MP 1304 no Congresso, com atenção ao calendário e aos pontos que tratam de abertura do mercado e de encargos. Mudanças de última hora podem alterar a conta projetada para 2026.

– Reuniões do CMSE e sinalização de despacho térmico. Cada rodada de avaliação do atendimento ao SIN influencia as expectativas para bandeiras tarifárias e para o preço de curto prazo, afetando negociações no ACL.

  • Decisões sobre concessões de distribuição e seus planos de investimento.
  • Leilão da PPSA e apetite por ativos no pré-sal.
  • Editais de fomento e linhas de crédito com critérios técnicos claros para projetos de energia e indústria.

Nota metodológica sobre os impactos estimados

Os valores de impacto citados (R$ por MWh) são estimativas com base em premissas conhecidas e cenários de aplicação de novas regras. A materialização depende de regulamentação, cronograma e comportamento do mercado. Cada consumidor tem perfil de carga, contrato e exposição diferentes, o que pode ampliar ou reduzir o efeito final na fatura. Por isso, os percentuais médios (5% a 12%) devem ser lidos como referência indicativa para planejamento e negociação.

Para avaliar seu caso específico, vale simular encargos com dados próprios de consumo e curvas horárias, usando cenários de PLD coerentes com a região e o ponto de conexão. É recomendável comparar propostas com a mesma cesta de encargos e com os mesmos critérios de reajuste, evitando surpresas. Quando possível, inclua cláusulas de renegociação caso ocorram mudanças estruturais na regulação que afetem substancialmente o equilíbrio econômico do contrato.

 

Onde os custos podem subir mais rápido

– Consumidores com grande variação de carga mês a mês tendem a pagar prêmios por flexibilidade mais altos. Ajustar processos para estabilizar o consumo reduz essa cobrança. Em alguns casos, a simples redistribuição de turnos mitiga oscilações suficientes para baixar o preço do contrato.

– Unidades em áreas com perdas elevadas no sistema de distribuição podem ver custos adicionais por critérios regulatórios. Investimentos de distribuidoras e metas de qualidade ajudam a atenuar, mas são movimentos de médio prazo. Enquanto isso, a gestão do lado do consumo continua sendo a alavanca mais rápida de economia.

Sinais de oportunidade no curto prazo

Quedas momentâneas de preços no mercado de curto prazo, como as associadas a alívios hidrológicos regionais, podem abrir janelas para recomposição parcial de posições. Consumidores com governança ágil e critérios de risco bem definidos conseguem contratar faixas de volume em condições vantajosas, desde que mantenham disciplina para não concentrar decisões em único momento. Ferramentas de monitoramento de PLD e relatórios de oferta e demanda aumentam a chance de capturar essas oportunidades.

Outro vetor é a competição entre comercializadoras por clientes de maior porte. Em períodos de maior liquidez, propostas com margens mais enxutas aparecem, especialmente quando o consumidor apresenta histórico claro, previsibilidade de carga e bom rating de crédito. Preparar a documentação e padronizar dados de consumo antes da rodada de cotações costuma acelerar o fechamento de condições melhores.

 

O que fica como aprendizado desta rodada

A inflação de setembro mostrou que choques setoriais podem dominar o índice em janelas curtas. No caso da energia, benefícios temporários e bandeiras tarifárias criam idas e vindas que exigem comunicação clara e planejamento. Para 2026, a discussão é mais estrutural: como ratear custos do sistema, ampliar acesso ao mercado livre e manter previsibilidade para investimento. A resposta passa por regulação estável, contratos bem desenhados e gestão ativa do consumo.

O Brasil tem escala, variedade de fontes e experiência em leilões e operação do sistema. O desafio é traduzir essas vantagens em preço competitivo e segurança de suprimento para a indústria e o comércio. Com regras definidas, equilíbrio entre responsabilidades e transparência na formação de encargos, o mercado tende a precificar melhor os riscos — e o consumidor ganha previsibilidade para decidir.

Última atualização em 14 de outubro de 2025

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